sexta-feira, 30 de outubro de 2009

RESIDÊNCIAS TRADICIONAIS: D. Hermínia Bessa


PENSÃO DE D. HERMÍNIA


Todos os estudantes de Xiquexique, nos anos 1950/1960 conheceram e ainda se lembram com saudades da Pensão de D. Hermínia ou "Buate Bessa" como a gente carinhosamente apelidava.

D. Hermínia Bessa era uma senhora idosa, bem humorada e que gostava dos jovens estudantes daquele tempo. Possuia uma pensão no início da Rua Gois Calmom onde costumava se hospedar a maioria dos representantes comerciais que chegavam à cidade. Era lá que a estudantada se reunia, duas ou três vezes por semana, para fazer um "assustado" até as 22:oo horas, quando a luz elétrica se apagava. Não sei a origem dessas pequenas festinhas que aconteciam na pensão de D. Hermínia, pois, quando comecei a dançar os estudantes mais velhos já frequentavam a pensão. Eram festinhas modestas realizadas na sala de jantar da pensão, após o afastamento dos móveis e animadas com discos de cera de carnauba (78 rpm) rodados numa pequena radiola elétrica. Era pequena, também, a diversidade dos discos que, de tanto passarem repetidamente ficavam gravados no subconsciente dos dançantes. A grande maioria eram os baiões de Luiz Gonzaga, algumas rumbas e mambos originados do Caribe, alguns boleros cantados pelo trio Los Pancho, de origem mexicana e também pelo Trio Irakitam, nacional. D. Hermínia e sua família que moravam na Pensão, ficava muito satisfeita com a nossa presença e acompanhava os volteios da joventude na sua sala de jantar com um ar de grande satisfação.

Hoje, quando passo pela Rua Gois Calmom e revejo a casa onde funcionava a pensão, atualmente já bastante modificada na sua arquitetura, sinto saudades daquele tempo em que a distração dos jovens xiquexiquenses se limitava a um passeio pelo jardim e um arrasta-pé na pensão de D. Hermínia. Foi nesses arrastas-pés que surgiram muitos namoros transformados em casamentos que perduram até hoje.

Parabéns a D. Hermínia e os nossos perenes agradecimentos, in memoriam", pela abertura da sua casa residencial e comercial para que a mocidade xiquexiquense dos anos 1960, sadiamente, se divertisse.

JMC/2009

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A CAATINGA



A CAATINGA

O Nordeste é uma região privilegiada, cheia de belezas e riquezas naturais. Possui quase todos as espécies de vegetação, tais como matas úmidas e secas, palmeirais, carrasco, manguezal, plantas costeira e caatinga, sendo esta um dos maiores biomas brasileiros ocupando grande parte da região nordestina.

A palavra caatinga para os índios significa "mata branca" ou "floresta branca". Esse nome tem a ver com o fato de a vegetação da caatinga, no período seco perder as folhas e apresentar um aspecto branco ou prateado. O clima na caatinga é semi-árido, quente, com pluviosidade oscilando entre 250 e 800 mm anuais, com duas estações: a chuvosa (o inverno) que dura em média 4 meses e a época seca (verão), durando 8 meses em média, sem chuvas.

Não obstante estar no semi-árido já foram identificados no nordeste, quase 600 espécies de plantas lenhosas, de um total de 1.356.

O município de Xiquexique está totalmente encravado no "Polígono das Secas", na caatinga, e nós, como caatingueiros e beiradeiros devemos conhecer a vegetação que cobre a nossa terra.

Semanalmente, pois, estaremos comentando sobre uma determinada árvore ou arbusto que vegeta em nossa caatinga. Naturalmente não poderemos falar sobre todas as espécies catalogadas. Mas, tratarei apenas das principais, aquelas que são nossas conhecidas desde criança e que faziam ou ainda fazem parte do nosso contidiano xiquexiquense. Assim provavelmente estarei comentado sobre o Umbuzeiro, o Angico, a Aroeira, a Canafístula, a Catingueira, o Cedro, o Faveleiro, a Imburana, o Juazeiro, a Jurema, o Marizeiro, a Oiticica, o Pau-d'arco e outras que no momento não estão aflorando na minha cabeça.

Serão comentários simples, nem nenhuma pretensão científica apenas desejando registrar e transmitir essa informação para os mais novos. Como é da linha desse blog estarei aberto para complementar a matéria com informações que eventualmente me sejam remetidas por algum leitor.

VAPORES: JURACY MAGALHÃES


O Vapor Juracy Magalhães
Era o maior vapor da frota da Navegação Baiana e, em função do seu tamanho navegava apenas 6 meses por ano, no período em que o rio estava cheio. Na época em que o rio sofria as secas periódicas o Juracy Magalhães ficava ancorado no porto de Juazeiro (BA) ou Pirapora (MG). Era também um dos vapores mais luxuosos que navegavam no São Francisco e o preferido pelos homens de negócios que viajavam até Juazeiro. Dispunha de bons camarotes e uma tripulação altamente treinada. Navegou até 1963, quando, irresponsavelmente foi desativado e ficou ancorado no porto de Juazeiro (BA) onde se acabou tomado pela ferrugem.
JMC/

POR DO SOL

Descanso dos Barqueiros.

Em Xiquexique, quando o sol se esconde exibindo o contorno da carnaubeira ao longe, é hora dos barqueiros lançarem âncoras e, sentados nas proas e popas dos barcos darem-se ao luxo de um bate papo entre amigos.

É hora de recolherem o produto da pesca, tomar um gole de cachaça e seguirem para suas casas onde receberão o carinho dos que ficaram aguardando o retorno.


CRÔNICA - DIA DE FINADOS

DIA DE FINADOS




"Um dia eu vou estar aqui também,

e gostaria que a pessoa viesse aqui

me ver, também, me prestigiar nesse

dia. Acho muito importante" (Autor desconhecido)


Finados é o dia em que todas as pessoas se preparam para, em visitas aos cemitérios, prestar homenagens aos seus entes queridos já falecidos e que ali repousam. Nessa data todos os túmulos, sejam os mais ricos revestidos de granito ou uma pequena cova adornada por uma simples cruz de madeira registrando a data do nascimento e da morte do parente ou amigo, estarão cercados de pessoas independente do estrato social, da etnia ou da denominação religiosa, portando flores e livros de orações para a visita mais importante do ano.
O dia de finados sempre foi valorizado pela Igreja Católica, desde o início, quando, ainda no séc. I os cristãos visitavam os túmulos dos mártires para rezar pelos que morreram defendendo a fé. Para que as orações dos vivos atingissem a todas as almas, no século V, a Igreja Católica instituiu um dia do ano para rezar por todos os mortos, pelos quais ninguém rezava e dos quais ninguém lembrava. Já no ano de 998 santo Odilon, pedia aos monges, seus irmãos, que orassem pelos mortos. E os papas Silvestre II (1009), João XVII (1009) e Leão IX (1015) obrigavam as comunidades de cristãos a dedicar um dia aos mortos. No século XI, o calendário litúrgico da Igreja Católica incorporou o Dia de Finados, que deveria cair no dia 2 de novembro ocasião em que as celebrações seriam dedicadas a todos os mortos. A primeira celebração do dia dos mortos pelos povos católicos foi feita pelos monges beneditinos na França.
Por isso, os cemitérios são locais de grande importância para todas as pessoas que, ainda encarnadas, perambulam por esta Terra aguardando a data do retorno. Pode-se dizer até, que são locais sagrados que devem ser respeitados e pisados com a maior reverência possível pois é ali que descansam, para sempre os que nos antecederam. Qualquer que seja a cidade brasileira, da maior à menor, a população, no dia 2 de novembro, pára e num momento de reflexão queda-se junto aos túmulos espalhados por todos os cemitérios desse nosso Brasil para dirigindo orações aos seus mortos, solicitar, também, que nos protejam na caminhada terrena. Nós não celebramos a morte, celebramos a vida, porque, nós cremos que Deus é misericordioso e que aqueles que partiram estão na graça de Deus. Então, é a celebração da esperança, da vida. E, essa visita ao cemitério é mais para lembrança, para recordar onde foi colocado o corpo daquele que nós amamos.
Xiquexique não foge a regra e tem como um dos seus costumes a ida de grande parte da população ao cemitério local reverenciar os antepassados. Existe até um grupo de pessoas, minha Mãe fazia parte desse time, que não satisfeitas com apenas a visita do dia de finados, caminham para o cemitério, todos os dias do mês de novembro, para rezarem pelas almas. É um bom hábito, pois, mesmo depois de mortos, com certeza continuamos precisando de orações que são o alimento do espírito.
Mas, o cemitério de Xiquexique, cuja construção foi autorizada pela Lei Municipal nº 26, de 19.03.1926, portanto há 83 anos, já não suporta a demanda de uma população calculada em 50 mil pessoas. E, como todos desejam uma pequena área para depositar o corpo do ente querido sempre ocorrem procedimentos inadequados e que prejudicam famílias cujos parentes já estão ali enterrados há muitos anos mas que, por impossibilidade financeira, não puderam ainda construir um túmulo de alvenaria. Como o cemitério não mais possui novos espaços para sepultamento, as pequenas e modestas sepulturas muitas vezes são invadidas e destruídas por pessoas estranhas à família, para que ali seja colocado um novo corpo. Por tudo isso, é urgente a necessidade de um novo cemitério.
Mas, enquanto o novo não chega, é mais premente a necessidade de uma campanha de sensibilização do nosso Poder Público no sentido de levá-lo a promover um saneamento no nosso cemitério. E, diga-se de passagem, o custo para isso é relativamente pequeno e quase insignificante para o Erário. Sem muitas pretensões, bastaria que a área fosse capinada eliminando-se a erva daninha que está impedindo o livre trânsito das pessoas. Poder-se-ia pensar, também, na delimitação de pequenas ruas cimentadas por onde as pessoas pudessem caminhar com mais conforto. Estas modestas melhorias nada representam se levarmos em conta a importância daquele lugar para todas as famílias xiquexiquenses.
O atual cemitério era conhecido até bem pouco tempo como “cemitério novo” denotando que existia um “cemitério velho”. E isso é verdade. O “cemitério velho” foi destruído pelo Poder Municipal e transformado numa praça ajardinada. No que pese a boa intenção considero que foi um desrespeito às famílias dos mortos que ali repousavam. Não é que os mortos precisassem do “cemitério velho”, mas, por certo os parentes ficaram sem um referencial importante para suas vidas. Acredito que se, naquela época, a sociedade xiquexiquense houvesse se organizado para estudar um destino para o “cemitério velho”, que já estava desativado, a solução teria sido melhor e diferente, talvez recuperando-o, iluminando-o e transformando-o num local de visitação tão ou mais importante que a pracinha construída sobre antigos túmulos.
É, para evitar o mesmo destino dado ao “cemitério velho”, que a sociedade de Xiquexique precisa estar atenta e se envolver com o necessário saneamento e permanente manutenção do “cemitério novo”. Mesmo sendo uma responsabilidade dos nossos Poderes Municipais, o zelo por esse equipamento é de toda a comunidade local e a OMISSÃO DO POVO, um dos piores males, se não o pior, é a maior responsável pela degradação da nossa sociedade. Unamos-nos e transformemos o nosso “cemitério novo” que não é assim tão novo, num local limpo, saneado, iluminado e que permita conforto e bem estar a todos os que procuram reverenciar os seus mortos.
Torçamos para que no próximo dia de finados, em 2010, possamos contar com esse ambiente. O Dia de Finados é o dia da celebração da vida eterna das pessoas queridas que já faleceram. Vida eterna que não vai terminar nunca, pois, a vida cristã é viver em comunhão íntima com Deus, agora e para sempre. É também o Dia do Amor, porque amar é sentir que o outro nunca morrerá.

Juarez Chaves/nov.2009 Blog XIQUEXIQUE

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

PRÉDIOS HISTÓRICOS - GEMIX


O GEMIX

Com o fechamento da Voz da Liberdade, cinema construído nos anos 1950, com dinheiro público, por um coletor federal de Xiquexique (BA), todo o acervo foi arrematado pelo empresário Custódio Moraes tendo com isso construído um outro cinema, agora na Av. J.J. Seabra, ao qual deu o nome de CINE BONFIM. Além de reiniciar a projeção de filmes que estava paralisada, Custódio Moraes caprichou na construção do prédio do cinema, que por muitos anos destacou-se como uma das construções mais importantes da cidade. Como empresário de visão dotou ainda, a sala de projeção com as melhores lentes existentes no mercado para uma melhor qualidade da imagem dos filmes projetados. No iníco dos anos 1980 Custódio Moraes resolveu desativar a sala de projeção e a cidade desde então continua sem uma sala de projeção de filmes.

O prédio, durante muitos anos passou a ser alugado e funcionou durante muito tempo como bar e restaurante.

Recentemente retornou às mãos de José Custódio Moraes, filho de Custódio Moraes que resolveu destina-lo para abrigar uma atividade nobre na cidade. Assim, após uma completa restauração, passou a ser a sede do GEMIX, local onde as pessoas idosas participam de atividades sociais e de lazer.

Parabéns está a população idosa de Xiquexique que dispõe desse privilegiado e bonito local para realizarem as suas reuniões sociais.

JMC/




domingo, 25 de outubro de 2009

VAPORES DO SÃO FRANCISCO - Fernandes da Cunha


"FERNANDES DA CUNHA"
O vapor “Fernandes da Cunha” foi construído em Juazeiro e começou a navegar no ano de 1926. Possuia o maquinário a vapor mais avançado da época com força de 176 HP e capacidade para deslocar 80 toneladas, carregando presas em cada lado duas lanchas "chatas" cada uma transportando 90 toneladas de mercadorias.

Em 1978 o vapor sofreu um incêndio quando estava ancorado no porto de Matias Cardoso a 413 km de Pirapora (MG), e para essa cidade foi levado a reboque e ali abandonado até hoje. A carcaça do vapor ainda continua paracialmente submersa no porto daquela cidade mineira.
Nos anos 1850 a máquina fotográfica não era um objeto difundido entre os sãofranciscanos chegando até a ser um objeto de luxo. Por isso são raras as fotografias dos vapores sendo necessária um intensa pesquisa entre os colecionadores. Do "Fernandes da Cunha", por exemplo, essa é a única fotografia que consegui obter e reproduz o período em que estava destruído pelo fogo, no porto de Matias Cardoso. Hoje o vapor está totalmente destruído já tendo sofrido, com certeza saque das peças mais importantes da sua maquinária.
JMC/


quarta-feira, 21 de outubro de 2009

RESIDÊNCIAS CLÁSSICAS - Francisco R. Soares

Residência de Francisco R. Soares

(Chiquinho de Bibi)






Clássica e confortável residência situada num ponto estratégico, delimitado pela Av. J.J. Seabra e a Praça 6 de julho, local onde acontecem os principais eventos da cidade.

Construída na primeira metade do século XX pelo político e conceituado comerciante Hermegildo Nogueira, atualmente pertence ao comerciante Chiquinho de Bibi que alí fixou residência há mais de 2 décadas. Não obstante haver realizado alguns melhoramentos no imóvel, no sentido de dotá-lo de uma melhor habitabilidade, Chiquinho teve o cuidado de manter a arquitetura original e dentro do possível a pintura interna nos mesmos padrões de quando foi feita a construção.
Chiquinho de Bibi, idôneo e conceituado comerciante em Xiquexique, com 90 (noventa) anos de vida mas ainda em plena atividade, é um cidadão dígno de toda a admiração dos xiquexiquenses pelo seu exemplo de uma vida totalmente dedicada à família e ao trabalho.
Parabéns a Chiquinho pelo seu empenho em manter conservada e em plena condição de uso a sua classica residência que muito honra e embeleza Xiquexique.

JMC/2008



CRÔNICA - O CAMPO DE AVIÃO


O CAMPO DE AVIÃO.

Xiquexique, nos anos 50, era uma cidade, mais importante do que hoje, pois, possuía além de um movimentado porto fluvial, onde atracavam os vapores, barcas a vela e a motor, canoas e paquetes, dispunha ainda de um aeroporto, que a gente chamava de “campo de avião”, com dois vôos regulares e semanais com destinos para Salvador e Belo Horizonte.

A empresa aérea que atendia a região era a REAL AEROVIAS S.A, que utilizava as aeronaves do tipo DC-3, do tempo da guerra e fazia a linha de Belo Horizonte a Salvador com escalas nas cidades de Pirapora MG, Januária MG, Carinhanha MG, Bom Jesus da Lapa BA, Barra do Rio Grande BA, Xique Xique BA, Remanso BA e Petrolina PE. Era um verdadeiro “pinga pinga” mas que prestava um excelente e rápido serviço para os barranqueiros tão carentes de meios de transporte principalmente ante a ausência de rodovias e ferrovias. Era o transporte que as pessoas de maior poder aquisitivo, comerciantes e autoridades, utilizavam nos seus deslocamentos até Salvador pra resolverem seus negócios particulares, comerciais ou de saúde. Eram muito seguros os aviões Douglas – DC3, mais tarde substituídos pelos Avros. Nenhum desastre aconteceu nesse período.

Mais tarde, no final dos anos 1940, a Real Aerovias S.A foi substituída pela Nacional Aerovias que até 1969 manteve a mesma linha utilizando os mesmos aviões DC-3 até que finalmente foi comprada pela Varig que explorou a linha por mais alguns anos utilizando, no entanto, aviões maiores do tipo AVRO. Foi fundamental na integração da região. Nessa época o Agente da empresa aérea era o Sr. Humberto Nogueira, uma das pessoas mais importantes da cidade. Na tarefa de vender passagens e despachar bagagens era ajudado por João Gama e Vaninho e as malas eram transportadas para o “campo do avião” numa carroça puxada a burro.

Apesar de um serviço regular e semanal de vôos, o “aeroporto” era uma construção muito modesta e de uma pobreza franciscana, pois se limitava a uma grande área, cercada por estacas de madeira e arame farpado com uma pista de piçarra. A estrutura de apoio era tão diminuta que o maior prédio era representado pela residência do vigia, Zuza do Campo, chamado de “guarda-campo”, encarregado da manutenção da pista (capina e retirada de animais) e da biruta. Ao lado da casa residencial existiam um galpão, toscamente construído e um pequeno depósito. O primeiro a abrigava as cargas e os passageiros e o segundo guardava tambores de combustíveis.

Mesmo com sua humildade e pequenez o campo de avião da minha terra era uma das maiores atrações da cidade não só para as crianças mas, para os adultos também. A gente sempre vibrava e ficava boquiaberto admirando o sobrevôo do avião sobre a cidade a uma altura rasante. A aeronave sempre chegava com pequena altitude, no sentido oeste/leste e, ao cruzar o Rio São Francisco deixava a impressão de que um grande trovão reboando sobre a cidade. Era assim o ronco dos aviões DC-3 veteranos da guerra de 1945 e que naquele tempo prestavam excelentes serviços nos tempos de paz.
A rapidez com que sobrevoava a cidade e a pequena demora no “campo” fazia com que as pessoas que estivessem interessadas em assistir o pouso se antecipassem à chegada da aeronave o que não era fácil dada a inexistência de uma hora determinada de aterrissagem. Era bonito de se ver a destreza do piloto em fazer chegar, suavemente, as rodas do avião ao solo pedregoso e poeirento da caatinga, levantando colunas de pó amarelo que às vezes ficava pairando no espaço quente e sem vento por um certo tempo.

Como Xique Xique não era um local de reabastecimento, a demora se limitava apenas ao tempo gasto em providenciar o embarque de algum passageiro. Nesse pequeno perídoo a tripulação com aquelas roupas bonitas e cheias de medalhas, quase como um conto de fadas, desembarcava e ficava debaixo da asa do avião conversando com algum conhecido e principalmente com as moças casadouras que entusiasmadas com a indumentária e o porte dos pilotos iam, também, assistir a chegada do avião à procura de um bom partido e ver se davam sorte de namorar com algum dos aviadores.

Nós os meninos, também ficávamos bem próximos da tripulação, mas o nosso interesse era que, num golpe de sorte, um dos tripulantes fumasse o último cigarro e jogasse ali a carteira seca. Era uma disputa para ver quem alcançava o troféu, pois de um modo geral eram cigarros de marca americana raros de chegar em Xiquexique. Cada carteira seca de um desses cigarros tinha um valor de mais de 10 vezes sobre as marcas nacionais que circulavam entre os fumantes locais (Continental, Colomy, Astória, etc) e, portanto, iria enriquecer sobremaneira as nossas coleções que fazíamos de carteiras de cigarro secas.

Concluído os embarques a tripulação novamente demonstrando competência e treino fazia a aeronave correr na pista de areia levantando um tornado de poeira que dessa vez cobria toda a cidade ante o empuxo dos motores e virando a direita pegavam o rumo norte, por sobre o Rio São Francisco, seguindo para a cidade de Remanso a próxima escala. Quanto a nós só restava voltar para casa, satisfeito se tivesse tido a sorte de conseguir a carteira de cigarro importado ou então aguardar para estar presente no “campo de avião” no próximo vôo.

Mas, o “campo de avião” de Xiquexique teve também o seu dia de desastre aéreo, pequeno é verdade e sem expressão nacional, para não fugir à regra dos grandes aeroportos. O avião sinistrado conhecido na época como Teco-Teco era um pequeno e velho monomotor, feito de canos de alumínio e lona emborrachada de propriedade de um pessoal que vinha da cidade de Pirapora (MG), com destino ao Garimpo do Rumo em Xiquexique. Numa incompetente manobra na pista de piçarra, o pequeno avião, transportando 4 pessoas, quebrou uma roda, arriou para um dos lados e não mais saiu do lugar. Os ocupantes, ilesos, pegaram suas coisas, abandonaram o pequeno avião no meio da pista e foram embora para o hotel. No dia seguinte, levaram Macilon, famoso mecânico de carro de Xiquexique que tentou consertar o avião, sem sucesso. Em face disso os donos do avião providenciaram a retirada do motor, dos instrumentos de navegação, do rádio e mais alguma coisa de valor e abandonaram a carcaça do pequeno avião.

Esse avião sinistrado permaneceu abandonado por muitos anos no “campo de avião” e era a alegria da meninada que subia na carenagem e fazia de conta que estava pilotando. Com o tempo, a lona se foi rasgando e os canos foram sendo serrados e levados, principalmente pela meninada que usava os pedaços para fazer rudimentares espingardas de chumbo, daquelas de carregar pela boca, que destinava à caçada de pequenos passaros.

As Escolas Reunidas Cezar Zama, onde estudei o primário, era bem pertinho do campo de avião e sempre que tinha alguma aterrissagem em horário de recreio dava tempo para, correndo, ainda ver o poeirão subir da pista da barro, nos momentos de decolagem e pouso. Era uma grande alegria para toda a turma.

Outra das nossas diversões era quando algum figurão decidia visitar a cidade e chegava de avião. Nessas ocasiões, nós meninos alunos da escola pública Cezar Zama, sempre éramos utilizados para, portando bandeirolas, receber os políticos no campo de avião o que fazíamos indo a pé e em fila indiana. Entre as várias vezes que fomos ao campo de avião receber políticos, uma me deixou marcada até os dias de hoje. Lá pelos idos de 1953 estávamos no aeroporto, enfileirados e bandeirolas nas mãos aguardando a chegada de Lauro Farani de Freitas, candidato ao Governo do Estado da Bahia, que vinha a Xiquexique fazer comício, quando para tristeza de todos recebemos a notícia de que o avião em que viajava o candidato caiu e matou todos os seus ocupantes. Foi uma tragédia e, mesmo sendo meninos, voltamos para casa, em fila e em silêncio.

Assim era a nossa vida de menino em Xiquexique. Até o modestíssimo “campo de avião” era para nós motivo de alegrias e tristezas. Mas na condição de menino pobre a gente ia enfrentando junto com as outras crianças todas as limitações impostas pela cidade e procurávamos arrancar diversões das coisas mais simples. O campo de avião era uma dessas coisas que sempre nos causou fascínio e admiração.

JMC/2006

domingo, 18 de outubro de 2009

BLOG DO ZECA

BLOGDOZECA

JOSÉ CUSTÓDIO BASTOS DE MORAES, conhecido em toda a Xiquexique por Zeca de Custódio, é um xiquexiquense que participou da fundação do MPC-Movimento pela Cidadania em Xiquexique, e atualmente mantém, produz e realiza o DEPENDE DE NÓS, um programa radiofônico, que vai ao ar todos os sábados entre as 17:30 e 19:00 Hs., através da CACTUS FM, 87.9.
Acessem o seu blog – http://www.blogdozeca-dependedenos.blogspot.com/ para se manterem atualizados com as notícias de Xiquexique.
Ouçam, também, os programa de rádio – SEMANA EM REVISTA e DEPENDE DE NÓS – levados ao ar todos os sábados das 12:30-14:00 e das 17:30-19:00 respectivamente.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

JOANA CAMANDAROBA - A Matriarca da Barra


JOANA CAMANDAROBA

Mesmo não sendo natural de Xiquexique, Joana Camandaroba é nordestina, barranqueira do Rio São Francisco e filha da vizinha cidade da Barra. Mantém fortes laços afetivos e familiares com Xiquexique (BA) em face de ali ainda residir alguns parentes e também pelo fato de ter sido professora de todas as mulheres xiquexiquenses que estudaram no Colégio Santa Eufrásia da Barra. Emérita educadora durante 40 anos ininterruptos, tendo saída da sala de aula aos 80 anos de idade, mesmo assim não parou de difundir cultura pela região que sempre valorizou o seu magistério, através dos vários livros que escreveu nesses últimos 15 anos. Recentemente foi protagonista da visita do Presidente Lula à sua cidade natal, ocasião em teve a oportunidade de entregar ao primeiro mandatário a sua mais recente obra "Barra, um retrato do Brasil" que discorre sobre a língua falada pelo Brasil, a língua do povo da Barra, a antropologia do povo, dos brejos, usos e costumes e demais assuntos relacionados com a nossa região sanfranciscana. Por tudo isso, sinto-me no honroso dever de registrar no Blog XIQUEXIQUE a entrevista que a ilustre Mestra concedeu à Terra Magazine.
PS.: Após a postagem desta matéria recebi telefonema de uma leitora informando que a Mestra D. Joana Camandaroba é xiquexiquense pois nasceu na Fazenda Utinga, de propriedade do seu genitor, situada no município de Xiquexique. Na oportunidade solicitou que fosse feita a retificação. Está feita.
No entanto, o fato de ser natural de Xiquexique, não desmerece a nobre Barra, pelo contrário, pois foi naquela cidade que D. Joana Camandaroba se educou e adquiriu todas as bases que até hoje amparam o seu vasto conhecimento. Foi alí, também, que D. Joana exerceu a maior parte do seu magistério e irradiou para todo o País, quiça para o mundo, as informações da sua vasta cultura. Parabéns Barra por ser o berço escolhido por tão importante senhora.
A seguir, a íntegra da famosa entrevista.
T M - Que idade tem a senhora?
J C - Tenho noventa e cinco anos, três meses, vinte dias e, neste momento, vinte horas, meu filho.
TM - Que livro a senhora entregou ao presidente Lula?
JC - Um dos quatro que escrevi, este com o padre Arlindo Itacir Batistel, é o "Barra, um retrato do Brasil".
TM - Sobre o que é o livro?
JC - Sobre a língua falada pelo Brasil, a língua do povo da Barra, a antropologia do povo, dos brejos, usos e costumes da região...
TM - A senhora é escritora?
JC - Fui professora por 40 anos. Parei de ensinar aos 80 e aí me deu um vazio. Preenchi com a literatura.
TM - A senhora foi professora do quê?
JC - De português, história... de quase tudo.
TM - Aqui em Barra?
JC - Ô meu filho, na Barra, em Formosa, em Santa Rita de Cássia, em Pilão Arcado, em Barreiras...
TM - A senhora sabe quanto alunos teve?
JC - Sei.
TM - Quantos?
JC - Todos da cidade, quase todos da região. Ensinei a todos. Ensinei tanto que não tive tempo para o amor, para namorar.
TM - O que a senhora disse para o presidente Lula?
JC - Pedi a ele que lesse a página 105.
TM - Por quê?
JC - Porque tem um texto belíssimo sobre a língua portuguesa, o português do povo. Língua que a gente esquece, a família e o povo esquecem.
TM - E por que esse livro e para o Lula?
JC - Porque ele é amigo do povo, se sente do povo e o povo se vê nele. Ouvi o discurso do presente, estava lá, senti isso nele, nos olhos dele, e nos olhos do povo.
TM - O que a senhora ouviu no discurso dele?
JC - Ouvir o discurso dele foi ouvir o discurso do povo. É a mesma coisa.
TM - A senhora foi professora por 40 anos e defende o uso correto da língua. Ainda que se possa discutir essa questão da "correção", o próprio presidente cansa de se referir publicamente a erros que cometia e ainda comete ao falar...
JC - Não é responsabilidade dele...
TM - Por que não?
JC - Aquilo que se escreve na alma de uma criança nunca mais se apaga.
TM - E...?
JC - ...o Lula presidente ainda fala como escreveram na alma dele quando criança e por isso mesmo muito ainda não se apagou...
TM - E que língua do povo é essa?
JC - A língua de todos os tempos, a dos vaqueiros, a dos brejos, a das periferias das grandes e pequenas cidades, a língua dos brasileiros, do povo. O meu livro fala disso, fala disso, fala até do transporte de padiola.
TM - Como?
JC - Meu filho, até os carros chegarem aqui os doentes eram transportados em padiolas. Eram quinze, vinte léguas a pé até as cidades. Escrevi o livro com padre que é lá do sul, é filho de italianos e por isso não domina, mas ama, nossa língua. Escrevemos juntos.
TM - E fala sobre mais o quê?
JC - Dos nossos costumes, tradições, transportes, princípios, casamentos, homens, mulheres...
TM - O que o presidente disse para a senhora?
JC - Que eu sou a noiva dele que tem cem anos...
TM - A senhora tem filhos?
JC - Não fui casada, meu filho. Não tive tempo para o amor, para namorar. Passei minha vida, 40 anos dela, a ensinar as pessoas. Isso também é amar, embora de outra forma. Dediquei minha vida à educação e, depois que terminou, minha vida ficou vazia. Aí veio a literatura, escrever preencheu esse vazio.
TM - E qual o outro livro?
JC - É o "caminho do Cristianismo". Desde Roma, das catacumbas, sobre todos os papas, o Concílio Vaticano II e João XXIII, João Paulo II, tem até um pouquinho sobre esse Papa de agora. E tem também a história de Dom Luiz Cappio, o nosso bispo.
TM - Como e quando começa essa história?
JC - Dom Luiz chegou aqui no dia 20 de setembro de 1974. Ele e mais três frades. Veio da Vila Guilherme, lá em São Paulo, e quando chegou nós até pensamos que ele fosse Lamarca, que mataram aqui perto. Tinha gente que até pensava que era o Lamarca vivo de novo, e vestido de frade.
TM - E vocês sabiam quem era Lamarca?
JC - Ô meu filho, eu sabia! Mas o povo hoje também sabe que ele foi um mártir, foi morto pelo exército no mato, homem de grande coragem. Lamarca foi um mártir do povo e por isso estará no santuário que Dom Luiz Cappio vai fazer.
TM - Que santuário é esse?
JC - Um santuário com os mártires do povo. Lamarca, um José de tal que morreu lá em Barreiras.
TM - Sim, mas e o capítulo do livro sobre Dom Luiz Cappio?
JC - A irmã dele, de São Paulo, me deu muito sobre a história dele. Quando chegou aqui ele dormia no chão. A mãe mandava roupas que comprava na Itália e ele dava tudo para o povo. O bispo é um homem muito firme. Quando ele decide uma coisa não tem mãe, pai, Cardeal, nem o Papa consegue fazer ele desistir. Eu sou muito amiga do bispo, ele é um homem de grande valor, muito próximo do povo.
TM - Noto aí uma contradição. A senhora escreveu sobre o bispo, é amiga e admiradora dele, mas foi à recepção ao presidente Lula, abraçou-o, deu a ele um livro....
JC - Fui, e ainda fui muito bem arrumada.
TM - Foi? Como?
JC - De vestido amarelo, com muita jóia. Brincos de ouro, anel de brilhante, uma pulseira de ouro branco, um medalhão com uma efígie de um dos reis da Inglaterra, coisa muito antiga, comprei em uma viagem a Portugal. Tenho e coleciono coisas antigas, vou doar para que se faça um museu na Barra.
TM - A senhora tem muita coisa boa?
JC Muita história. Tenho duas arcas, cheias, que pertenceram às irmãs de João Maurício Vanderlei, o Barão de Cotegipe, a segunda figura do Segundo Império. Ele foi a favor das Leis do Ventre Livre, do Sexagenário, mas foi contra a Lei Áurea...
TM - Por qual razão?
JC - Ele disse à Princesa Isabel: "O Brasil não tem condições econômicas de suportar o fim da escravidão, a senhora libertará uma raça, mas perderá um trono". E a princesa respondeu: "Quantos tronos eu tivesse para dar pela liberdade humana eu daria".
TM - Onde a senhora aprendeu isso?
JC - Não aprendi, eu ensinei, por 40 anos. Está na história, nos livros.
TM - A senhora se considera de que raça?
JC - Eu sou mulata não, eu sou negra.
TM - Dona Joana, o Bispo chegou à greve de fome contra a Transposição do São Francisco. Então, como é que senhora foi lá receber a comitiva? E o bispo, onde estava?
JC - Fui, e muito arrumada, porque Lula merece. Já recebi muitos candidatos a governador em minha casa, até a presidente da República, mas Lula é o primeiro presidente, o primeiro Chefe de Estado que vem a Barra. E olha que Barra é muito antiga...
TM - Quem foi o candidato a presidente que esteve em sua casa?JC - Jânio Quadros. Se hospedou aqui em casa. Meu irmão, que é médico, aposentado, trabalhou e dirigiu coisas importantes por muitos anos no Hospital das Clínicas, tinha um uísque muito bom. Jânio bebeu quase tudo...
TM - E aí, o que aconteceu?
JC - Saiu zonzo daqui de casa dizendo "Até o Planalto". E ele foi para o Planalto mesmo, mas depois fez aquela bagunça lá e nos deixou a todos na mão...
TM - Deve ter tomado umas garrafas...
JC - Olha, meu filho, acho que foi isso mesmo.
TM - ACM esteve aqui?
JC - Esteve. Ele era inimigo, adversário, mas ficou amigo depois que trouxe pra ele um remédio.
TM - Que remédio?
JC - Golbery, o general Golbery, me deu um remédio e pediu que eu mandasse pra Antônio Carlos quando chegase à Bahia. Fiz isso...
TM - Remédio pra quê? E onde a senhora encontrou Golbery?
JC - Pra uma dor que ele tinha na garganta e não sarava. Acho que foi de tanto gritar quando ele foi nomeado. Fui a Brasília pedir dinheiro para que as escolas não fechassem, fui ao Congresso, e depois encontrei Golbery que me pediu para entregar o remédio. Antônio Carlos tinha seus defeitos, nós sabemos, mas tinha uma grande qualidade, a gratidão.
TM - Então a senhora foi ter com Lula porque gosta dele e...
JC - Eu gosto e o povo gosta.
TM - E Dom Luiz Cappio?
JC - Não sei, pergunte a ele. Mas sei que ele me disse que agora não é mais Lula, é Luiz Inácio. Mas acho que ele ainda deve gostar.
TM - Estão dizendo que tiraram a rádio comunitária da igreja do ar para que não se fizesse críticas ao presidente...
JC - Não é isso não, é o contrário. E antes deixa eu te dizer uma coisa: Dom Benjamim Capelli tem oitenta e tantos anos. É um homem muito bom, quase um santo. Cuida da saúde do povo, cuidou sempre dos leprosos, já nem tem mais leprosos aqui na Barra. E ele foi ao aeroporto receber Lula, abraçou Lula, de quem ele gosta muito.
TM - E como foi no aeroporto? Não estávamos lá.
JC - Tinha duas, três mil pessoas, Lula quebrou o protocolo, falou e abraçou um bocado de gente do povo.
TM - Mas e a história da rádio...?
JC - Meu filho, o problema não é o Lula, que é amado pelo povo, nem o governador...
TM - O Jaques Wagner?
JC - Isso, ele é bem bonitão, sabe? É simpático, o povo gosta muito dele também. Acho que até porque sabe que ele também gosta de uma pingazinha, como o povo também gosta...
TM - ...se o problema não é Lula, se não é o Jaques Wagner, então qual é o problema?JC - O problema aqui, meu filho, é o Geddel.
TM - O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima? Mas por que ele é o problema se as decisões sobre o rio são tomadas acima dele?JC - Sim, mas ele se dizia contra a Transposição... aí arranjou esse emprego bom e ficou a favor. Mas isso não foi o pior, não...
TM - O que foi, então?
JC - Ele foi muito deselegante com o bispo, e o povo gosta do bispo. Ele foi mal comportado, não é flor que se cheire. Ou, como diz o povo daqui, Geddel não é boa abelha, não!
TM - Mas, apesar disso tudo, a senhora foi ao Lula, deu um livro de presente a ele, o bispo ficou em silêncio e a rádio da igreja também.JC - Quem foi que disse que o bispo ficou em silêncio?
TM - Ninguém ouviu uma palavra dele, tiraram a rádio do ar, dizem que foi o governo, ele nem ficou na cidade, não protestou...
JC - ...(Gargalhadas) Meu filho, quem tirou a rádio do ar, rádio que é da igreja, foi o bispo mesmo, para não ter que falar da festa. E o bispo falou o dia inteiro, a cidade inteira ouviu, de tempos em tempos, o dia todo...
TM - Mas falou onde?
JC - Falou com os sinos da igreja...
TM - Como?
JC - Falou com os sinos, eles tocaram o dia todinho.
TM - A senhora me explica melhor, por favor, Dona Joana?
JC - Meu filho, os sinos tocaram, dobraram o dia inteiro...
TM - Dobraram o quê?
TM - (Gargalhadas) ...Dobraram a Finados. Teve festa pro Lula, pro governador, mas os sinos daqui da Barra dobraram a Finados o dia inteiro. Para o Geddel.

Terra Magazine
Bob Fernandes

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

RIO SÃO FRANCISCO - O Minhocão


O MINHOCÃO

Segundo os pescadoes do Rio São Francisco “O minhocão” é o rei do rio, mandando e desmandando na vontade dos peixes e na vontade das águas. Na opinião de muitos "o minhocão" é um surubim de mais de 300 anos de idade que de tão velho perdeu as barbatanas, ficou roliço sem escamas e que enfurecido por isso vive fazendo mal, virando embarcações e comendo os outros peixes. Dizem que dele nascem os porcos d'água, monstros das profundezas, muito feios, que têm a frente de porco e o resto do corpo de peixe e que sob as ordens do minhocão cavam os barrancos fazendo-os tombar, danificando com isso as roças de vazante plantadas pelos beiradeiros.

PRÉDIOS HISTÓRICOS - Clube dos Operários



SOCIEDADE BENEFICIENTE DOS OPERÁRIOS

A sociedade Beneficente de Operários foi fundada no dia 15 de agosto de 1935 e a sua primeira diretoria foi assim composta: Presidente: Francisco Emerenciano da Cruz; Vice-Presidente: Nelson Alves de Almeida; Tesoureiro: Antenor Benevenuto de Carvalho; 1º Secretário: Osmar Guedes e 2º Secretário: João da Lapa Araújo.
O clube, conhecido como "Operária" no que pese sempre ter contado com sócios de menor poder aquisitivo nunca se deixou abater e devagar e continuadamente tem progredido não só em termos de quadro social mas também na manutenção e melhoria da sua sede e outros bens patrimoniais.
A "Operária" é hoje em Xiquexique o local onde são realizados todos os eventos sociais da cidade.


Os sócios da "Operária" estão, pois, de parabéns pela perseverança e disposição para manter o únco local de entretenimento social tão importante para a cidade.




JMC/2009

CRÔNICA - O Circo


O CIRCO
Uma das grandes alegrias para os meninos de Xique Xique, na década de 1950, era a chegada de um circo na cidade. Na grande maioria eram muito pobres com a empanada já bastante remendada e que sequer tinham uma lona para cobrir o teto. As sessões eram a descoberto que de certa forma se tornava agradável por permitir a circulação da brisa noturna diminuindo o calor para o público. Raramente surgiam circos portando a cobertura superior de lona colorida. A maioria, mesmo contando com cobertura de lona esta se apresentava já bastante gasta pelo uso e com uma cor única geralmente marron claro.
A programação do circo também era de uma simplicidade a toda prova, pois limitava-se a números de palhaços contando piadas no picadeiro, algum trapezista fazendo exibições de balanços e para finalizar um dramalhão ou uma dançarina em trajes de banho requebrando ao som de uma rumba ou um cha-cha-cha. As pessoas que trabalhavam no circo geralmente pertenciam à mesma família e descendiam de um velho circense que sempre ganhara o pão de cada dia deslocando-se de cidade em cidade do interior fazendo exibições que duravam em torno de 30 dias.
Às vezes os circos chegavam por via fluvial, pelos vapores que trafegavam pelo São Francisco e o simples desembarcar das peças já era motivo de distração e lazer para o povo da cidade, pois, já a partir desse momento, toda a comunidade se acotovelava no cais para conhecer os artistas. Outras vezes chegavam por rodovia em 2 ou 3 caminhões velhos e os artistas, em caminhonetas e rurais também velhas. De imediato, davam uma circulada pela cidade para divulgar a chegada. Após conseguirem o espaço e a licença da Prefeitura para instalarem o equipamento, contratavam mão-de-obra local e em pouco mais de 2 dias estava o circo pronto para ser armado no local que melhor servisse aos interesses dos circenses. Até 1950, quando ainda não existia o jardim os circos costumavam ser armados na Praça D. Máximo, mas, após essa data os locais variavam e muitas vezes os circos foram armados na Praça do Mercado ou na Praça Luiz Viana O trabalho de armar se limitava a construir uma cerca circular perimetral de arame farpado e dentro dela, também em forma circular estendia-se a lona lateral. Por dentro da lona lateral construíam-se as arquibancadas formadas por tábuas de madeira apoiadas em estrutura de ferro. Essa arquibancada que a gente chamava de “galinheiro” ficava em volta do picadeiro onde eram apresentadas as funções do circo.
Apesar da pobreza e da repetição dos mesmos programas a cada noite, a vontade que gente tinha era de estar sentado no “galinheiro”, todos os dias, ouvindo as mesmas piadas do palhaço e dando gostosas risadas como se as estivéssemos ouvindo pela primeira vez. Éramos ingênuos, sem muita exigência e qualquer diversão por mais simples que fossem nos trazia muitas alegrias.
Mas, mais pobre do que circo eram alguns meninos e meninas de Xique Xique, principalmente eu, pois minha Mãe não dispunha de dinheiro para pagar o meu ingresso, nem mesmo uma vez por semana, aos domingos, quando a afluência ao circo era maior. Assim, a única maneira que a gente tinha para assistir ao circo no dia que a gente quisesse, era sair “gritando” o palhaço pelas ruas da cidade, à tarde.
Explico como isso funcionava.
Todos os circos, anunciavam o espetáculo da noite, através de um palhaço equilibrado sobre grandes pernas de pau, usando um megafone feito de folha de flandre e acompanhado de um grupo de meninos, que lhe servia de coro e apoio.
O interessante disso tudo era que na divulgação do espetáculo noturno o palhaço de cima das suas longas pernas de pau usava uma cantoria que era comum a todos os circos que aportavam em Xiquexique. Parecia até que eles, os palhaços, tinham cursado a mesma escola pois sabiam "de cór e salteado" a referida cantoria. Assim, após sair do interior do circo e já em plena rua, o palhaço equilibrando-se nas longas pernas de pau e cercado pela meninada, entoava a seguinte cantoria cuja cadência e sequência era a mesma para todos:
- “Ô raia o sol / suspende a lua” ,
e a meninada em torno do palhaço respondia em coro:
- “olha o palhaço / no meio da rua “ .
Às vezes em determina rua, o palhaço parava, anunciava o espetáculo, as principais atrações da noite e, em seguida, voltava à tradicional cantoria:
- “hoje tem espetáculo ?”
E, a meninada em coro respondia:
- “tem sim sinhô”
- “oito horas da noite?”
- “tem sim sinhô”.
- “hoje tem palhaçada” .
- “tem sim sinhô”.
- “Hoje tem marmelada?”
- “tem sim sinhô.”
- “arrocha negrada”
E, nessa hora toda a meninada se matava de gritar.
- “E o palhaço o que é ?”
-“é ladrão de mulher”

“Arrocha negrada”.
E assim o palhaço continuava a percorrer as ruas da cidade, sem um prévio roteiro até que o sol começasse a se por e a penumbra tornasse arriscado o passeio com as longas pernas de pau. Nessa hora o palhaço retornava ao circo, e cada menino do “coro”, recebia um carimbo de tinta na parte de dentro do antebraço, para que pudesse ter acesso ao espetáculo daquele dia. Era a paga por ter ajudado o palhaço na divulgação do circo.
E aí era que estava a complicação. Minha Mãe não permitia de forma alguma que eu acompanhasse o palhaço ou como se dizia naquele tempo “gritasse palhaço”. Dizia ela que aquilo era coisa de vagabundo e de gente que não tinha o que fazer. Filho dela não ia sair circulando por toda a cidade atrás de palhaço para receber entrada de circo. Ai de mim se fosse pego gritando o palhaço. Tomaria uns bolos de palmatória e ficaria sem sair à noite. Ponto final.
Mas, eu, nos meus 8 a 11 anos, não pensava assim e achava que era uma coisa muito boa, pois além de me divertir à tarde “gritando palhaço” ainda ganhava uma entrada no circo, coisa que ela não podia me dar, todos os dia. E, escondido, me apresentava no circo entre os meninos que, naquela tarde iam acompanhar o palhaço da perna de pau. Para que minha Mãe não me visse atrás do palhaço eu evitava segui-lo quando este passava pela Praça D. Máximo, em frente à minha casa, pois com certeza minha Mãe estaria na janela para verificar se eu estava “gritando” o palhaço. Nessa hora eu estava circulando por detrás da Praça D. Máximo para reencontrar a turma no outro lado fora das vistas da minha santa Mãe.
Mas, o pior estava por vir. Era quando eu chegava em casa para tomar banho e jantar que minha Mãe, esperta como sempre, me pedia para ver a parte interna do antebraço. Ela tinha conhecimento do local da marca que a gente recebia quando retornava ao circo após gritar o palhaço.
Após ser flagrado duas vezes com a marca no braço e ter sofrido os castigos dos bolos e de não sair à noite, o jeito foi conversar com o palhaço, pois já era conhecido, para que a minha marca fosse feita na parte superior do braço, quase no ombro, e assim ficasse coberta pela camisa.
A partir daí sempre mostrava o antebraço limpo a minha Mãe e apenas tinha o cuidado de, no banho, evitar passar sabão no local da marca para não apagá-la. Com esse artifício quase todas as noites me deleitava com as atrações do circo.

JMC/2007

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

VAPORES - Mata Machado

O VAPOR MATA MACHADO

Era um vapor feio, mas tido como o mais veloz e o de maior força pois conseguia deslocar até 75 t de peso. Pertencia à frota da Viação Baiana e, como todos os demais tinha o casco achatado, para evitar que encalhasse nos bancos de areia.
Foi um dos primeiros vapores a navegar no Rio São Francisco, tendo chegado à cidade de Pirapora (MG) em 1906 ano em que o rio teve uma grande enchente, subindo 7 metros acima do seu leito normal.
Ao chegar à Pirapora (MG), o Mata Machado encontrou no porto o vapor Saldanha Marinho e a partir dessa data considera-se inaugurada a navegação a vapor no São Francisco.


JMC/2008

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Por do Sol



O ANOITECER NA AVENIDA

O por do sol, visto da Av. J.J. Seabra, em Xiqueique (BA), sempre é um bonito espetáculo. É a partir desse momento que o clima começa a ficar agradável permitindo um passeio a pé pela avenida podendo-se chegar até a beira do rio.
Impassível a tamareira, que já está se tornando um símbolo da cidade, deixa-se recortar em silhueta para um maior embelezamento da chegada da noite.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

PRÉDIOS HISTÓRICOS - Ponto Chic


PONTO CHIC

O Ponto Chic era um dos tradicionais e históricos prédios de Xiquexique (BA), construído na primeira metade do sec.XX entre as praças D. Máximo e Getúlio Vargas. A foto é anterior a 1950 e, pelo vestuário das pessoas postadas à frente do prédio pode-se inferir o nível dos frequentadores do local. A maioria com paletó e chapéu. Nesse prédio funcionaram muitos estabelecimentos comerciais, principalmente bares e pontos de jogos de sinuca. Hoje a construção está totalmente desfigurada, veja foto menor ao lado, abrigando algumas pequenas lojas, e não mais demonstra a pujança que teve na época da sua construção.

JMC/2009





























RESIDÊNCIAS CLÁSSICAS - Marialda Moraes




Casa de Marialda.

A minha prima-irmã Aldinha, com a qual tenho um penhor irresgatável de gratidão, resolveu fixar residência na Rua Goes Calmon (Rua Grande) e lá construii uma linda e confortável residência prestigiando e valorizando aquela via pública, além de deleitar os transeuntes com a bela visão arquitetônica
Parabéns Aldinha, pela beleza da sua residência que por certo valorizará a rua em que foi construída e já está entre os prédios mais importantes de Xiquexique.




JMC-ago/09

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

VAPORES - Barão de Cotegipe



O VAPOR BARÃO DE COTEGIPE

O Barão de Cotegipe foi o vapor que mais deixou saudades nas barrancas do Rio São Francisco. Até hoje, os barranqueiros comentam saudosamente sobre o som melodioso do seu apito. Quando apontava na curva do Canal do Guaxinim, que separa a Ilha do Gado Bravo da Ilha do Miradouro e inicia a Ipueira, com destino ao porto de Xiquexique, o "Prático", da sua cabine de comando, acionava o dispositivo para que toda a população tomasse conhecimento de que o "Barão" estava chegando. Era uma alegria geral com todos correndo em direção ao cais para assistir o vapor "encostar". Na saída, quando levantava âncora e já no meio da Ipueira se encaminhando para adentrar o Rio São Francisco, onde dominava, o "Barão" emitia novo apito, desta vez com um timbre e uma frequência diferentes que o povo, ainda de pé e postado na beira do cais, entendia como de despedida ou de um até logo. Todo mundo em Xiquexique, pode-se afirmar, identificava o apito do "Barão", como era carinhosamente conhecido por todos os barranqueiros.
Fabricado nos Estados Unidos em 1913, foi reformado em 1967. Final e criminosamente foi abandonado no porto em Pirapora (MG), com o casco enterrado num banco de areia onde ficou atá a sua destruição total. Tinha 43 m de comprimento com capacidade para deslocar 80 toneladas. Era o vapor preferido para se viajar com destino a Juazeiro (BA).
obs.: O nome do Vapor foi dado em homenagem ao Barão de Cotegipe, título nobiliárquico concedido por D. Pedro II ao Presidente da Bahia e Ministro das Relações Exteriores, Dr. João Maurício Wanderley, nascido em 23.10.1815 na cidade da Barra (BA) e nomeado, em 1842, primeiro Juiz de Direito de Xiquexique, onde exerceu a magistratura até 1844, sendo depois eleito Deputado Provincial por nove mandatos consecutivos. O Dr. João Maurício Wanderley, Barão de Cotegipe, era pai de João Ferreira de Araujo Pinho, governador da Bahia nos anos de 1908 a 1912 e avô de Wanderley Pinho que foi Prefeito de Salvador de janeiro de 1948 a abril de 1951. O Barão de Cotegipe faleceu no ano de 1889.

POR DO SOL



OCASO

Este é o por do sol que os xiquexiquenses estão acostumados a ver todos os dias. O sol vai, devagarinho se escondendo por detras da Ilha do Gado Bravo e o povo ribeirinho não se cansa de admirá-lo até que desapareça totalmente. Olhando a foto fica-se com a impressão que em poucos minutos o sol irá mesmo desaparecer.
A Ipueira, impassível, convida para um esporte aquático, que ainda por lá não chegou ou para uma pescaria de anzol praticada diariamente há séculos.

RESIDÊNCIAS CLÁSSICAS - Sr. Marinho Carvalho

Residência do Sr. Marinho de Carvalho


Marinho Pereira Carvalho nasceu no dia 03 de Julho 1887 em Vila de Cana Brava, atual cidade de Uibai (BA), como filho de Maria Rita do Carmo Carvalho e de Bernardo Pereira Carvalho. Casou-se com a Sra. Rita da Rocha Carvalho.
De família pobre, começou a trabalhar aos 11 anos e por isso não tinha tempo de frequentar escolar regular. Mesmo assim, com esforço proprio aprendeu a ler e escrever.
Veio ainda jovem para Xiquexique e nessa cidade dedicou-se ao comércio negociando "secos e molhados" além de tecidos e pedras preciosas.
Num arroubo aventuresco e quando ainda não havia rodovia em Xiquexique, comprou 2 caminhões em São Paulo, sendo um deles Ford 1926 e os fez chegar utilizando trem de ferro até Pirapora (MG) e daí até Xiquexique, de vaporpelo Rio São Francisco. Por sua própria iniciativa e seus próprios recursos construiu uma estrada de Xiquexique a Uibaí, inclusive com uma ponte sobre o Rio Verde. Mesmo morando em Xiquexique não abandonou a sua terra natal e em Uibaí dedicou-se à atividade agrícopecuária na Fazenda Brasil onde chegou a ter um engenho para o fabrico da rapadura. Mesmo sem nunca haver exercido um mandato político Seu Marinho exerceu muita liderança e muita influência na política partidária de Xiquexique. Faleceu no dia 24.06.1978.
Em homenagem ao desbravamento rodoviário da região, é patrono da Rodoviária de Xiquexique (BA) bem como foi honrado com o seu nome afixado numa praça na cidade de Uibaí.
OBS.: Em comentário, Andrea Carvalho, informa que Orlando Negrão de Carvalho, seu pai e filho mais velho do Sr. Marinho Carvalho, é quem atualmente reside na casa objeto desta matéria. Parabéns Orlando por estar conservando uma das mais bonitas casas de Xiquexique.
JMC-set/09

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

VAPORES - Wenceslau Braz


O VAPOR WENCESLAU BRAZ

Navegou no Rio São Francisco até o ano de 1968, transportando mercadorias e passageiros, quando naufragou na cachoeira do Sobrado onde hoje está localizada a Barragem de Sobradinho, na Bahia. Era considerado um dos melhores vapores para o transporte de passageiros. Após o naufrágio, recuperado, ainda navegou até o ano de 1975 e, em julho de 1981 foi totalmente desativado e transformado em "chata" para o transporte de carvão vegetal. Foi mais um vapor criminosamente desativado do Rio São Francisco, deixando os ribeirinhos e a própria Nação sem o concurso de um seguro e barato meio de transpote. E, extrema ironia, quando navegava consumia lenha para alimentar sua caldeira e, após desativado continuou a ajudar no desmatamento agora transportando o carvão que terceiros obtêm da queima das matas.

JMC/mar-2005