sábado, 19 de março de 2011

Crônica Xiquexiqueana: O CAUBOI XIQUEXIQUENSE

BALAS CAUBÓI
Juarez Morais Chaves
Na década de 1950, vez em quando aparecia em Xique-Xique (BA) alguma novidade, não obstante a pequena comunidade baiana estar situada a uma distância de mais de 500 km de Salvador e sem uma boa ligação rodoviária.
Foi o caso da chegada na cidade do Sr. Alberto Brasileiro, homem de boa estatura, simpático e que ganhava a vida caracterizando-se de caubói americano, faltando apenas o cavalo branco.
Nos fins de semana, nos programa de calouros apresentados no cine-teatro “A VOZ DA LIBERDADE”, exibia-se fantasiado de vaqueiro americano, cantando músicas dos filmes de faroeste e finalizando-as o famoso refrão ....ô tiroleí,...ôleí, tiroleí, etc...
Era o tempo do pós-guerra quando os filmes de caubói, os faroestes, exportados pelos Estados Unidos para a América Latina, eram a coqueluche em todos os rincões do Brasil. Contavam estórias de bandidos e mocinhos durante a conquista do oeste americano com destaque para o Roy Rogers e o seu cavalo branco que era o mocinho mais imitado pelos caubóis nativos tipo Alberto Brasileiro.
Para conhecimento dos mais novos xiquexiquenses, “A VOZ DA LIBERDADE” era uma casa de diversão, misto de cinema e teatro, situada na Rua Marechal Deodoro conhecida como Rua da Sete. Foi construído nos anos 50 por um servidor público federal com desvio de recursos do erário. Tinha como objetivo concorrer com “A VOZ DO BARRANCO” outra casa de lazer cuja principal atividade era a projeção de filmes. Ficava situada na mesma rua quase em frente à concorrente. “A VOZ DA LIBERDADE” sobreviveu poucos anos e era a preferida por quase a totalidade da população de Xique-Xique ante a diversidade de atrações que ofertava, inclusive a do caubói Alberto Brasileiro. Mas, a briga "A VOZ DA LIBERDADE" x "A VOZ DO BARRANCO" é assunto para outra crônica. Voltemos ao caubói.
Alberto Brasileiro não estava ali fantasiado de caubói para fazer gracinhas para ninguém. Tinha aparecido naquele brabo sertão dos anos 50 para ganhar dinheiro. Após ficar bem conhecido em face das suas apresentações semanais na “A VOZ DA LIBERDADE”, tratou de montar um negócio comercial que rapidamente se alastrou pela cidade sob o nome de “BALAS CAUBÓI”. Instalou na Pr. Getúlio Vargas uma pequena loja onde vendia umas balas cilíndricas, de açúcar, com sabores artificiais, fabricadas na residência do caubói por sua própria mulher ajudada pelos filhos. Essa balinha era envolvida por uma pequena cédula imitando dinheiro, com valores que iam de 1 a 100 unidades, denominadas de “CAUBOI”. Por cima da bala e da cédula enrolava-se um papel fosco.
Nessa época eu fazia o curso primário nas ESCOLAS REUNIDAS CÉZAR ZAMA e sendo colega de sala e amigo de Wellington Brasileiro, filho mais velho do referido caubói, tinha acesso à sua casa que ficava a uns 50 metros da casa da minha mãe, para onde sempre me dirigia com o intuito de ler os inúmeros gibis com estórias de caubóis e outros heróis em quadrinhos dos anos 50, já que Wellington era detentor de uma grande quantidade desse tipo de revistas.
Com o passar do tempo, contudo, permitiram que eu ajudasse na fase de enrolar as balas com as cédulas. A fiscalização era grande, semelhante a do Banco Central, pois na realidade aquele “dinheiro” permitia a compra das mercadorias expostas na lojinha montada pelo caubói.
Em cada bombom havia apenas uma cédula de "CAUBÓI", sendo que a grande maioria era do valor de 1 Unidade. Era muito difícil se conseguir uma nota de 5, 10 ou 20 unidades. As notas de 50 ou 100 era extremamente raras daí a vontade que a meninada tinha de comprar o máximo possível de balas, para se obter o máximo de dinheiro caubói. Quem tivesse a sorte de conseguir uma cédula de 100 caubóis passava a ser assunto de comentários em toda a cidade ficando na obrigação de exibir a nota para todos os meninos. A curiosidade era grande. Apenas na lojinha montada pelo caubói de Xique-Xique eram vendidas as famosas balas, única maneira de ter acesso ao “dinheiro” necessário para comprar as coloridas bugigangas de plástico que ali estavam expostas, mas que naquela época eram grande novidade e por isso atraiam e excitavam as crianças.
Eventualmente Alberto Brasileiro se dignava aparecer na Loja das Balas Caubói e, quando isso acontecia era um corre-corre da meninada para ver o ídolo da “A VOZ DA LIBERDADE”, mesmo não estando caracterizado. Alberto Brasileiro tinha consciência disso e rareava as suas aparições em público para não banalizar a sua imagem de artista.
Como a lojinha, devido à pequenez era insuficiente para suprir todas as necessidades familiares, já que Alberto Brasileiro tinha mulher e filhos, o caubói se dedicava a outras atividades para complementar a renda familiar e, além da sua apresentação semanal na “A VOZ DA LIBERDADE”, apresentava-se, também, nos pequenos parques e circos que naquela época sempre marcavam presença e passavam uma temporada nas cidades do interior. O seu repertório era o mesmo apresentado na "A VOZ DA LIBERDADE" e sempre concluía com a famosa cantiga "OH! SUZANA NÃO CHORES POR MIM".
E, por aí o velho caubói ia levando a vida.
Alberto Brasileiro, do jeito que apareceu se foi, com toda a família e nunca mais deu notícia.

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